Um espectro ronda o capitalismo: a proposta de um imposto mundial sobre todas as transações financeiras, conhecido como Taxa Tobin, já não é uma ideia maluca dos alteromundistas. Foi discutida no G20 em Pittsburgh nesta sexta-feira. A cúpula das maiores economias desenvolvidas e emergentes encomendou ao FMI um estudo da proposta, para examinar em sua próxima reunião, em junho de 2010, no Canadá.
Por Bernardo Joffily

Bandeira do Attac em manifestação: 'Estão desvirtuando'
Do Fórum Social para Pittsburgh
A infiltração da proposta subversiva no seleto conclave dos governantes mais poderosos da Terra é filha legítima da crise econômica. Antes dela, a Taxa Tobin frequentava quase exclusivamente as pautas dos movimentos sociais, como o Fórum Social Mundial.
Em Pittsburgh, porém, o imposto mundial foi defendido por gente como, por exemplo, pelo ministro das Finanças da Alemanha, Peer Steinbrück. É verdade que Steinbrück é um social-democrata dentro do governo da conservadora Angela Merkel, e em apuros na eleição parlamentar deste domingo (27). Mas a própria Angela comprou a ideia em Pittsburgh, apenas com a condição de que seja... não apenas em alguns países, mas mundial, ou "no mínimo no nível do G20".
A França, onde a ideia sempre foi popular, apoia a Taxa Tobin: já votou uma lei abrindo caminho para que implantada, pelo menos na Zona do Euro. O presidente Lula já ventilou a ideia, assim como uma variante – um imposto mundial sobre as vendas de armas. Finlândia, Bélgica, Índia e Austrália também mostravam simpatias.
O inusitado é que ela frequente um fórum como o G20, e gere essa recomendação ao FMI, mesmo sem entrar no comunicado oficial. Até o primeiro ministro britânico, John Brown, disse que a proposta "merece consideração". O presidente da Comissão Europeia, José Manuel Barroso, disse que "seria uma excelente ideia"...
Um pouco de história
Um pouco de história ajuda a entender o potencial explosivo dessa bandeira.
A Taxa Tobin deve o nome a seu primeiro propositor, James Tobin (1918-2002), americano e Prêmio Nobel de Economia. Foi em 1972 que ele fez a sugestão de um imposto mundial sobre a totalidade das transações financeiras – o que representaria uma imensa fortuna, mesmo com a diminuta alíquota proposta, de 0,05% a 1%.
A ideia, evidentemente impopular nos meios do capital financeiro, terminou prosperando no lado oposto das contradições sociais do planeta. Quando estourou a Crise Asiática de 1997, o editor do jornal francês de esquerda Le Monde Diplomatique, Ignacio Ramonet, lançou em editorial a proposta de "uma associação por uma Taxa Tobin de ajuda aos cidadãos".
Sob o impacto da crise de 97 (que era apenas um pálido prenúncio do que seria a de 2007-2008-2009), a proposta vingou. Em 1998 nasceu a Attac (Associação pela Taxação das Transações Financeiras e pela Ajuda aos Cidadãos – mais tarde mudou as palavras filais para Ação Cidadã, http://www.attac.org). É uma rede de entidades e movimentos sociais, hoje organizada em 36 países (não no Brasil) e ainda ligada ao seu objetivo de nascença, embora atuando em outras frentes.
Desde então, a Taxa Tobin prosperou justo nos meios alteromundistas, sindicais e de economistas de esquerda. Carregava porém uma incômoda pecha de quixotismo: onde já se viu um imposto sindical? E ainda por cima sobre as finanças!
Tobin: "Estão desvirtuando meu nome"
O próprio James Tobin tratou de distanciar-se da ideia que ele próprio lançara mas ganhara impulso próprio. Em 2001 ele declarava que "muitos dos elogios" à Taxa Tobin "não vê, dali onde devem vir". E arrematava:
"Eu sou economista e, como a maior parte dos economistas, defendo o olivre mercado. Além disso, apoio o FMI, o Banco Mundial e a OMC, tudo que esses movimentos atacam. Estão desvirtuando meu nome".
Na verdade, Tobin foi sempre um economista conservador. A própria argumentação original da taxa se vinculava mais à necessidade de dar estabilidade ao mercado financeiroe não a uma intenção distributivista do tipo Robin Hood.
Nova fase na luta de ideias
A Taxa Tobin, assim, terminou renegada por seu autor e abraçada por economistas à esquerda, como os americanos Joseph E. Stiglitz e Lawrence Summers, ou o alemão Paul Bernd Spahn, que desenvolveu-a, propondo alíquotas e dois níveis, bem mais pesadas em momentos de instabilidade financeira.
Já o coro arrasador da "maior parte dos economistas" espinafrava a ideia. Dizia que mesmo sendo uma taxa leve ela inibiria o livre mercado, retirando-lhe liquidez. Que entraria em colisão com o princípio do segredo bancário. Que se inviabilizaria caso alguns países, por exemplo os paraísos fiscais, quebrassem a norma mundial.
Não se sabe ainda que conclusões sobre o tema serão levadas à próxima reunião do G20. O FMI, apesar de ter recebido uma meia-sola nesta sexta-feira, com maior participação dos países do Sul, não é propriamente um embandeirado das inovações econômicas progressistas ou um inimigo do capital financeiro.
Mas o fato do tema ter aflorado em Pittsburgh mostra a que ponto a crise é profunda, inclusive no plano das ideias. Mas evidentemente o cenário criado é um forte estímulo ao reforço da bandeirapor parte dos movimentos sociais do mundo. Por que, para começar, não se organiza uma filial brasileira do Attac?
Fonte: Vermelho.org.br
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