O Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) deu claros sinais de que vai elevar a taxa básica de juros (Selic) em sua próxima reunião, convocada para 27 de abril. O órgão divulgou nesta quinta-feira (25) a Ata da reunião realizada na semana, em que deliberou por maioria (cinco votos a três) pela manutenção da Selic em 8,75%.
Por Umberto MartinsHoje, o Brasil já exibe o incômodo título de campeão mundial dos juros altos. Mas o Comitê, que define a política monetária do Banco Central com um viés conservador, ainda não parece satisfeito e sinaliza um novo aumento entre 0,5% e 0,75%, com o objetivo de frear o consumo, os investimentos e o ritmo de crescimento do PIB.
Inflação
A justificativa ou pretexto não mudou: conter a ameaça de inflação. O primeiro ponto da Ata já traduz a preocupação com a evolução recente dos preços. “A inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) avançou substancialmente, de 0,37% para 0,75% em janeiro e 0,78% em fevereiro. Com isso, a inflação acumulada no primeiro bimestre alcançou 1,54%, ficando 0,5% ponto percentual (p.p.) daquela observada em igual período do ano anterior”, ressalta.
O documento também se refere à forte recuperação do nível de emprego, usando os dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), a evolução positiva do consumo e das vendas e a redução da capacidade ociosa da indústria, que indicam aquecimento das atividades econômicas. “O Nível de Utilização da Capacidade Instalada (Nuci) na indústria de transformação calculado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), sem ajuste sazonal, registrou 83,1%, em fevereiro, 6,1 p.p. acima do patamar observado no mesmo mês de 2009”.
Medo do crescimento
O cenário externo, embora instável e duvidoso, também sinaliza a recuperação da economia mundial, na opinião do Copom. “Nos mercados internacionais”, analisa, “a aversão ao risco mostrou arrefecimento desde a última reunião do Comitê, em contexto de liquidez abundante. Nesse ambiente, tanto os preços de ativos brasileiros, favorecendo a distensão das condições financeiras domésticas, quanto os de certas commodities apresentaram recuperação. Assim, cabe notar que as perspectivas para o financiamento externo da economia brasileira seguem favoráveis. Por outro lado, a trajetória dos índices de preços evidencia retomada de pressões inflacionárias externas”.
Todos esses fatores (crescimento do emprego, do consumo, dos investimentos, do PIB, da utilização da capacidade ociosa e o cenário externo favorável) são acompanhados com desconfiança e receio pelos especialistas do Banco Central, que em tudo enxergam o temível fantasma da inflação. O medo do crescimento é tamanho que deu origem ao estranho dogma de que o Brasil não pode crescer mais de 3% ao ano sem despertar o dragão inflacionário.
Ciclo de expansão
“O Copom entende”, sustenta a Ata (parágrafo 19) “que, com a confirmação das incipientes evidências de intensificação das pressões da demanda doméstica sobre o mercado de fatores, aumenta a probabilidade de que desenvolvimentos inflacionários inicialmente localizados venham a apresentar riscos para a trajetória da inflação. Nesse contexto, aumenta também o risco de repasse de pressões de alta dos preços no atacado para os preços ao consumidor.” Também se faz referência à elevação das projeções do próprio BC e do mercado financeiro para a inflação de 2010, que subiram e se encontram " sensivelmente acima do valor central da meta (4,5%) para a inflação " .
O órgão considera “plausível afirmar que a economia já se encontra em um ciclo de expansão, ainda que persista incerteza, que deverá ser redimida ao longo do tempo, sobre o ritmo deste processo”. Assim, “o Copom avalia que, diante dos sinais de robustez da demanda doméstica, ocasionando redução da margem de ociosidade dos fatores de produção, evidenciada por indicadores de utilização da capacidade na indústria e do mercado de trabalho, e do comportamento recente das expectativas de inflação, aumentaram os riscos para a concretização de um cenário inflacionário benigno, no qual a inflação seguiria consistente com a trajetória das metas”.
Consenso
A intenção de elevar os juros em 27 de abril transparece mais claramente no parágrafo 30 da Ata. “Note-se, adicionalmente, que também houve consenso entre os membros do Comitê quanto à necessidade de se adequar o ritmo do ajuste da taxa básica de juros à evolução do cenário inflacionário prospectivo, bem como ao correspondente balanço de riscos, de forma a limitar os impactos causados pelo comportamento da inflação corrente sobre a dinâmica subjacente dos preços.”
De resto, o Comitê reconhece que “o comportamento das remessas de lucros e dividendos contribui para elevar o déficit em conta corrente acumulado em doze meses, que se deslocou de US$24,3 bilhões em dezembro para US$25,4 bilhões em janeiro, equivalentes a 1,6% do PIB”.
Oligarquia financeira
Convém notar que o diagnóstico e as projeções sobre inflação não são consensuais entre os economistas. Os índices de preços estão recuando em março e alguns analistas consideram que a aceleração da inflação no primeiro bimestre foi pontual e não configura uma tendência para todo o ano.
Os críticos da política monetária desconfiam que outros interesses orientam a política monetária conservadora do BC vão além do combate à inflação, pois os juros altos promovem uma brutal transferência de renda de vários setores da sociedade para a oligarquia financeira e os especuladores, ao mesmo tempo em que sabota o desenvolvimento nacional.
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