As dezenas de conferências nacionais realizadas nos últimos anos, reunindo representações sociais com interesses específicos, tiveram forte influência na aprovação de leis pelo Congresso Nacional, transformando debates teóricos em medidas práticas. O assunto foi tema de um estudo divulgado pelo Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj).
A pesquisa denominada A Democracia Brasileira entre Representação e Participação. As Conferências Nacionais e o Experimentalismo Democrático Brasileiro abordou 80 conferências realizadas entre 1988 e 2009 e relacionou as diretrizes traçadas em cada uma com as proposições legislativas no Congresso. A maior parte das conferências foi realizada a partir de 2003, durante o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.“Esse estudo se propõe a investigar o impacto do processo das conferências nacionais na produção legislativa. O processo foi fortemente dinamizado no governo do presidente Lula, ao ponto de que mais de 60% de todas as conferências realizadas desde 1941 aconteceram de 2003 para cá”, disse o secretário nacional de Articulação Social, Gerson Almeida.
Segundo ele, o estudo concluiu que as conferências têm se mostrado um bom instrumento
de apoio às decisões legislativas. “A informação sobre os mais variados temas, a partir das
conferências, acaba sendo de grande importância para os parlamentares brasileiros. Um percentual muito significativo [das diretrizes das conferências] teve uma relação direta com as
emendas e projetos de lei”, destacou o secretário.
Almeida rebateu as críticas de que as conferências se perdem em debates teóricos sem virarem medidas práticas. Citou iniciativas importantes adotadas no país, como o Sistema
Único de Saúde (SUS), o sistema nacional de assistência social e o Plano Nacional de Combate à Desigualdade Racial como reflexos diretos dos debates conferenciais.
Movimento Comunitário
Para a presidente da Confederação Nacional de Associações de Moradores (Conam), Bartíria Costa, as conferências tem tido como resultado propostas e resoluções positivas para o país. Bartíria avalia que a quantidade de propostas deliberadas dificulta a efetivação da totalidade das resoluções das conferências, mas acredita que houve avanços significativos no período do governo Lula. "A política urbana só foi efetivamente para a pauta a partir da conferência construída junto com o Ministério das Cidades em 2003", avalia Bartíria. Apesar de acreditar que questões centrais pautadas nas conferências ainda estão longe de serem resolvidas, a presidente da Conam considera que a Conferência das Cidades foi "um espaço importante de participação que fez avançar pautas que estavam travadas há muitos anos, como a criação do Fundo Nacional de Habitação e Interesse Social. Também tem a ver com o debate realizado nas conferências a Polítivca Nacional de Saneamento Ambiental, a Lei dos Resíduos Sólidos e a revisão de planos diretores em diversas cidades brasileiras passarem a ser debatidos com participação da sociedade civil".
A coordenadora da pesquisa, Thamy Pogrebinschi, trabalhou durante dez meses, com uma equipe de cinco pessoas. Segundo ela, foi possível se estabelecer uma relação direta, entre as
conclusões das conferências nacionais e as ações legislativas.
“As conferências nacionais decididamente impactam na produção legislativa do Congresso Nacional. Há um número significativo de projetos e de leis que possuem pertinência temática com as diretrizes deliberadas nas conferências”, destacou a professora do Iuperj.
Juventude
Para o presidente da União da Juventude Socialista (UJS), Marcelo Brito, "a capacidade que as conferências tem tido de mobilizar a sociedade é a maior vitória delas". A UJS participou da 1º Conferência Nacional de Juventude e compõe o Conselho Nacional de Juventude (Conjuve). Embora o presidente da UJS considere a pesquisa relevante, ele acredita que "analisar as conferências pela forma como estão sendo aproveitadas as suas bandeiras é insuficiente, pois o que tem se constituído é o fortalecimento da participação da sociedade. A Conferência Nacional de Juventude, por exemplo, mobilizou 400 mil jovens debatendo não uma, mas várias propostas que afetam diretamente a vida da juventude". Marcelo Brito lembrou que as medidas que a Primeira Conferência Nacional de Juventude elegeu como prioritárias ainda não foram materializadas - o Estatuto da Juventude e o Plano Nacional de Juventude -, mas defendeu que "uma das principais funções das conferências é criar um novo canal de interferência da sociedade na elaboração e no acompanhamento da implementação de medidas de governo", e completou: "muitas bandeiras de fato tem sido aproveitadas, embora o aproveitamento das propostas aprovadas em conferências ainda seja insuficiente".
O presidente da União de Negros pela Igualdade (Unegro), Edson França, também valorizou as conferências pela mobilização da sociedade que promovem. Para ele, as resoluções ajudam as medidas de governo a terem "consonância com os pleitos da sociedade civil". Entre as medidas implementadas como fruto do processo de debate da 1ª Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial, Edson citou a aprovação do Estatuto da Igualdade Racial.
A pesquisa estabeleceu uma relação quantitativa entre as resoluções e a produção do Congresso. Segundo o trabalho, das 1.937 diretrizes das conferências analisadas, foram gerados 2.808 projetos de lei e propostas de emendas constitucionais, ainda em trâmite à época da pesquisa. Além disso, segundo a pesquisadora, foram identificados outros 321 projetos de lei emendas constitucionais aprovados, sendo 312 leis ordinárias ou complementares e nove emendas constitucionais, totalizando 3.129 proposições legislativas. A íntegra da pesquisa estará disponível no site do Iuperj.
De São Paulo, Luana Bonone, com Agência Brasil
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