Nos anos de chumbo, auge do regime militar, entre as décadas de sessenta e setenta, militante clandestino, travestido de vendedor ambulante para sobreviver e fugir à perseguição policial, pude vivenciar, ao lado de Luci, o modo como o brasileiro dos grotões sobrevive: resistindo ao ambiente social injusto com fé, coragem e alegria.
Na tarde de ontem, quarta, cenas pungentes reviveram na memória no instante em que me pronunciava da tribuna da Câmara Municipal sublinhando a importância da 1ª. Conferência Nacional de Comunicação como ponto de partida da luta pela democratização da mídia, agora colocada na agenda do país. É que para exemplificar a necessidade e o valor da produção local na grade de programação das redes de TV, exibi em plenário um VT de 5 minutos do programa “Pé na rua”, apresentado por Ivan Moraes Filho, dirigido por Andrea Ferraz e produzido pela Ateliê Produções, na tela às 15 horas dos sábados, na TV Universitária.
O “Pé na rua” revela a vida do nosso povo, a realidade nua e crua, mesclando a denúncia com o que há de melhor na gente simples da periferia: a arte de sobreviver reinventando a própria existência – no sentido do poema de Cecília Meireles. Como conta, com crueza e poesia, a produtora Carolina Vergolino:
“Foi numa manhã que eu soube. O corpo já estava enterrado. O corpo era grande, negro e bonito. Quando vivo, o riso era solto, a alma é livre. Assassinado. Foi morte matada. Morto a pedradas. Como? Pedradas.
Valei-me meu Deus, como pode? Como pode tanto ódio? De onde vem essa ira capaz de matar uma pessoa (outra) a pedradas? E são tantos, uns a tiro, outra facada, outros... pedrada. E nós nesse mundo? O que fazer?
Frente à solidão da morte, com o telefone em punho liguei para os amigos. Conversamos na sala de casa e rapidamente decidimos. Unimos forças e resolvemos fazer uma passeata na TV. Optamos por comunicar, afinal somos jornalistas. Queremos comunicar amor. Trocando balas, facadas, pedradas por amor. Romântico, simples (como se fosse) e até um tanto quanto piegas. Mas não há de ser nada, a gente gosta e acredita nisso tudo.
O sonho é transformar, o exercício é tentar e o melhor mesmo é conseguir. Um sentimento de amor aqui, outro acolá e a gente vai acreditando. Para todos, 26 minutos de amor, todo sábado, às 15h na TVU.”
Um belo exemplo, sim, de como a produção local pode levar ao telespectador uma informação de qualidade, envolta num misto de contundência e leveza.
Por: Vereador Luciano Siqueira
Artigo publicado no site da Revista Algo Mais
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